20 dezembro 2017


Há fantasmas pelo natal

De noite
enquanto dormimos

há fantasmas que nos visitam e revisitam 
São essas as noites em que sabemos
que o mundo lá fora não dorme tranquilamente
São as mesmas noites estas em que agora escrevemos sentidos
de coisas só para nós sentidas
noites estranhas de anódinos silêncios
em que dormem apenas aqueles que podem dormir
Noites em que uma certa luz teima em chamar
não sei se para ver melhor os vultos as sombras os espectros 
não sei se para não ver melhor os três fantasmas que se aproximam 
e que não somos capazes de acarear devidamente 
que vêm não sei se de levante seguindo uma luz promissora para estenderem 
a Mão
e terem uma sopa por companhia onde escrever os sonhos perdidos
longe das luzes das árvores centrais o seu lugar o ocidente  
onde virem a jusante ou outro lugar  
De noite uma cortina 
sempre aberta e sombras nubentes desenhadas nela com que dormimos
nunca se sabe se por detrás do pano algum fantasma 
desses que estendem a mão para mover uma dama uma torre um nimbo 
o natal passado jogado como se não tivesse existido jamais
uma fogueira à volta da casa onde as sombras são o que fomos
ou somos hoje o que as sombras puderam ter sido naquela fogueira falecida 
Às duas ou às três da manhã o menino deseja continuar a ser o mesmo menino 
(ou a todas as horas) quando os três natais se aproximam dele
procurando o presépio que já não está estando em louçanas aporias  
às vinte e quatro horas da existência do dia vinte e quatro de consoada
estenderei a mão para ti desfiando cada hora cada dia e dir-te-ei 
Amigo 
para que também os fantasmas sejam parte de nós 

e assim possamos dormir
enquanto é dia




Norberto do Vale Cardoso
(Poema publicado em 2006, reescrito em dezembro de 2017)

1 comentário:

Odete Ferreira disse...

Li e reli:
Um poema de sublime mensagem, do e de desassossego.
Que façamos todos um pouco para que a noite seja menos povoada de fantasmas.
Parabéns, Norberto do Vale Cardoso.