O Porta-Voz do Deus Menino
Era
Natal
Chovia
E à
medida que caminhavas
Na lama
Eu
ficava a pensar
Se
acaso serias
O
porta-voz do Deus Menino
Que
nessa noite
Nos chama.
Os teus
pés descalcinhos
Doridos
pelo frio
Faziam-me
a cada passo que davas
Uma onda
de arrepio.
Mas
mesmo descalcinho,
Dorido,
Tu
prosseguiste sempre
Ao
longo do caminho
Que se avista da minha janela…
–
Fiquei a observar-te enlevada
E de
repente notei
Que havias caído
Naquela
rua tão enlameada. -
Saí de
casa a correr
E fui ter contigo…-
Eras uma linda
criança
de feições suaves
E olhar sereno.
– Disseste-me
logo o teu nome Que nem perguntei:
– Sou João. -
E acrescentaste:
Tenho frio e tenho fome,
Não posso andar mais.
Sou cigano, sou pobre,
Minha avó morreu ontem
Vou à procura de meus pais.
Quase fiquei atónita
Ante a
desenvoltura e a graciosidade
De tua
tão tenra idade…
Levei-te para minha casa
E tu, contente,
Passaste comigo a noite de
Natal.
– É
esta a tua história João…-
Depois ficaste,
Cresceste,
fizeste-te homem
Calcei-te,
vesti-te, matei-te a fome
E
ensinei-te
A que me chamasses mãe.
Hoje,
és bem o filho
da minha
alma,
A doçura que acalma
O meu passado ingrato e vazio!
– Ainda
agora ao recordar Essa noite de Natal
Em que
te conheci descalcinho
E
transido de frio
Eu fico a pensar
Se na verdade não serias
O
porta-voz do Deus-Menino
Que
nessa noite nos chama!…
Maria das Dores Bianchi Thedim
(Poema publicado no livro POLEN, 1969)
1 comentário:
Belíssimo na forma e, sobretudo, no conteúdo!
Parabéns por nos ter trazido este poema, O Porta-Voz do Deus Menino.
Vivência ou metáfora... Que importa?
Bjinho, Maria das Dores
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