Nota
do editor
A raia foi muito mais que um espaço geográfico. A raia
foi um microcosmo, um espaço multicultural, económico e comunitário, um espaço
de partilhas que os seus habitantes sempre souberam conciliar, às vezes
ignorando a lei, lei essa muitas vezes ao serviço de outros interesses e não os
dessa comunidade.
A raia, como se percebe, é o pano de fundo de grande
parte dos contos que o autor nos oferece. Essas vivências transfronteiriças
surgem-nos num período conturbado da nossa história, num período em que a
guerra civil grassava em Portugal e onde, mais uma vez, os ideais eram comuns
em ambos os lados da fronteira.
Perante esta realidade histórica, que é um facto, somos
obrigados a questionar-nos sobre a física fragilidade da mesma e, quem sabe, a
elevar o nosso pensamento para este nosso tempo, este início do século XXI,
muito próprio, muito global, mas simultaneamente egocentrista.
Consuelo, o amor proibido, não é uma obra de mera ficção. Estas bem urdidas
narrativas de Bernardino Henriques possuem uma dimensão humana que me leva a
apostar na sua divulgação. Nelas, há a eterna luta entre a emoção e a razão,
seja ela qual for, e que muitas vezes é o resultado de uma época histórica, de
uma ética e moral vigentes, e não fruto do desenvolvimento e do progresso
humano.
O ser humano é-nos apresentado frágil, cheio de
contradições, e nem o estatuto profissional o consegue enobrecer. As emoções,
sejam elas de celibatários ou não, acabam sempre por influenciar o nosso
comportamento, às vezes extremo, e a questão põe-se mais uma vez: onde acaba a
emoção e começa a razão, ou vice-versa?
O autor não nos dá nenhuma resposta,
e nem é necessário. Isso é sempre algo que permanecerá na consciência de cada
um de nós, e poderá ser sempre avaliado de diferentes perspectivas. Há uma
relatividade em tudo o que é profundamente humano, esse relativismo é atávico,
faz parte da sua natureza e permanecerá nele, em nós, ao longo da sua
existência.
António Sá Gué
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